No dia 24 de março, no Estádio do Dragão, Portugal e Turquia fazem o primeiro jogo de acesso ao Mundial. Em caso de vitória, os portugueses enfrentam Itália ou Macedônia do Norte para definir a vaga na Copa do Mundo
A Seleção Portuguesa não gosta muito de vencer com tranquilidade. Foi assim no título da Eurocopa de 2016 e na classificação para as Copas da África do Sul e do Brasil. Em 2010, precisou vencer a Bósnia e Herzegovina e, em 2014, derrotou a Suécia também na repescagem. Agora, o Futebol das Quinas relembra este último duelo eletrizante que garantiu os portugueses no Mundial.
Primeiramente, vamos entender o contexto que as duas seleções estavam nas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2014. Pelo grupo C, a Suécia ficou na 2ª posição atrás da poderosa Alemanha, que viria a ser a campeã no ano seguinte. Já pelo grupo F, Portugal viu a Rússia ser a líder do grupo e, por isso, precisaria passar pela repescagem. Naquela altura, foi um duelo de craques entre Cristiano Ronaldo e Zlatan Ibrahimović, o qual somente um estaria na Copa. No fim, você já sabe quem levou a melhor.
Diferentemente da repescagem para a Copa de 2022 no Catar, naquela altura, as seleções precisavam passar apenas por um adversário, mas com confrontos de ida e volta. Portugal não teve tanta sorte e precisou decidir fora de casa, mas com a vantagem. Isso porque no dia 15 de novembro de 2013 – 4 dias antes do jogo de volta – as equipes se enfrentaram no Estádio da Luz. Em uma partida equilibrada, a Suécia teve melhores momentos, mas Cristiano Ronaldo tratou de deixar Portugal em vantagem no fim.
Aos 82’, Meireles cruzou e o camisa 7 se adiantou à defesa e, de cabeça, fez 1 a 0 para Portugal, que ainda escutou sonoras vaias dos adeptos que estavam nas bancadas e queriam uma vantagem mais confortável para o jogo da volta. Entretanto, este resultado fez com que os tugas fossem para Estocolmo, capital sueca, com a vantagem do empate e também um trunfo: o gol fora de casa. Por não ter levado nenhum em Lisboa, qualquer tento marcado na Suécia valeria o dobro.

Com isso, em 19 de novembro de 2013, a Friends Arena foi o palco de um dos maiores jogos da história das eliminatórias. Talvez possa parecer exagero de quem escreve, mas não. Foi um jogaço de muitas viradas no placar. A Suécia de Erik Hamrén era a mesma. Já Paulo Bento fez uma mudança com relação ao primeiro jogo: Hugo Almeida ganhou o lugar de Helder Postiga no comando de ataque luso.


Com atmosfera brilhante a favor dos donos da casa, a Suécia começou pressionando, mas quem teve a primeira grande chance foi Portugal. João Moutinho – o homem das bolas paradas – cruza na cabeça de Bruno Alves que cabeceia, obrigando Isaksson a fazer uma grande defesa. Além das bolas paradas, a principal jogada portuguesa era o lançamento longo procurando Cristiano Ronaldo. O camisa 7, por sua vez, brigava com a defesa e arriscava chutes de fora da área.
A partida ficava tensa a cada minuto e isso retratava a quantidade grande de erros de passes e ligações diretas da defesa para o ataque. Bem verdade que estamos falando de um jogo de 2013 e a troca de passes ainda não era uma constante no futebol mundial, porém qualquer situação de pressão, os defensores se livravam mais da bola do que propriamente tentavam uma jogada ofensiva. Em uma rara chance, Cristiano cruza e acha Hugo Almeida sozinho, mas o atacante que na época vestia a camisa do Beşiktaş, perde a oportunidade de dar tranquilidade aos portugueses.
Os 11 titulares e os clubes que atuavam em 2013
Rui Patrício (Sporting); João Pereira (Valencia), Pepe (Real Madrid), Bruno Alves (Fenerbahçe), Coentrão (Real Madrid); Raul Meireles (Fenerbahçe), Miguel Veloso (Dínamo de Kiev), João Moutinho (Mônaco); Nani (Manchester United), Hugo Almeida (Beşiktaş) e Cristiano Ronaldo (Real Madrid)
Do outro lado, Olsson é o jogador mais perigoso de uma Suécia que tinha dificuldades. A primeira chegada de perigo foi somente aos 41’ quando Ibra fez o pivô para chute de fora da área de Kim Källström. Rui Patrício não teve tantos problemas e encaixou a bola.
Nervosismo foi a palavra que resumiu bem o 1° tempo. Os suecos eram empurrados pela torcida e buscavam intimidar a seleção portuguesa com vaias. O principal foco era Cristiano Ronaldo. Por diversos momentos, gritos de “Messi Messi” eram entoados com o objetivo de provocar o atacante que estava no seu auge pelo Real Madrid. Parece que o tiro saiu pela culatra.
Logo no início do segundo tempo, Portugal já deu indícios que os últimos 45 minutos seriam totalmente diferentes e um dos mais emocionantes da história da repescagem europeia. Aos 47’, Fábio Coentrão faz excelente jogada, passa por 4 defensores e serve Cristiano Ronaldo. O astro no auge dos seus 28 anos chuta para boa defesa de Isaksson. A Suécia, por sua vez, não queria ficar atrás e já no contra-ataque, Ibra ganha no corpo a corpo e deixa Larsson livre na pequena área para marcar, mas esbarra em Rui Patrício. Em menos de 3 minutos, já teve muito mais emoção do que na primeira parte.

Aos 49’ começa o grande show de CR7. E iniciou com uma roubada de bola na defesa com Bruno Alves que serviu Raul Meireles. O barba lança Hugo Almeida na posição de pivô e deixa João Moutinho livre. Com espaço para pensar, a visão de jogo de Moutinho é fatal ao achar Cristiano em profundidade entre a linha de defesa sueca. O camisa 7 arranca, deixa Olsson para trás e, com a perna esquerda, chuta cruzado, inaugurando o placar na Friends Arena.
Agora, a Suécia precisava de 3 gols em 38 minutos. Mas não era algo impossível no imaginário do torcedor. Na fase de grupos das mesmas eliminatórias, os suecos marcaram 4 gols em 28 minutos contra a Alemanha. A partida terminou em 4 a 4, depois dos alemães estarem vencendo por 4 a 0 aos 11 minutos do segundo tempo. Mas voltando para o confronto decisivo contra os portugueses, os suecos tinham uma jogada clássica: a bola longa buscando Ibrahimović ou Elmander. Nesse cenário, Bruno Alves e Pepe – que na época ainda ostentava cabelo – levavam a melhor sempre.
Diante disso, coube a bola parada resolver para os nórdicos. Aos 67’, Pepe tenta proteger a bola para ganhar o tiro de meta, mas acaba cedendo o escanteio, até mesmo depois de pedir falta de Zlatan. Na cobrança, Källström coloca a bola na cabeça de Ibra que quase não sai do chão para empatar. Estava ali o início da esperança sueca. No lance seguinte, o próprio Kim Källström pede pênalti após cair na área em contato com João Pereira, mas o árbitro marca simulação e dá o amarelo para o camisa 9. A atmosfera já era completamente diferente em Estocolmo.
Quatro minutos depois, em mais uma tentativa de lançamento sueco, Pepe corta para cima e a bola ia sobrando para Elmander, porém ele sofre falta de Miguel Veloso na meia lua. Mais uma desatenção portuguesa que custa caro. A 18,4m da baliza, Källström ameaça chutar, mas quem finaliza mesmo é Ibra. Com um tiro forte rasteiro no canto de Rui Patrício, Zlatan leva a torcida ao delírio ao virar a partida. Bem verdade que era uma bola defensável para Patrício, mas o arqueiro acabou engolindo o chute no seu próprio canto.

Depois da virada, por alguns minutos pareceu-se inevitável que a Suécia faria o 3° gol e se classificaria. Ibra que por tantas vezes era criticado por sumir em jogos importantes, desta vez, era decisivo. Inclusive, com o seu ego característico deu uma entrevista marcante à TV sueca TV4 logo após o sorteio da repescagem. Ao ser perguntado quem iria vencer, Zlatan disse que “Só Deus sabe”. O repórter despretensiosamente logo brincou que seria difícil perguntar para ele. Mas, o craque sueco logo respondeu: “Você está falando com ele agora (risos)”. Autoestima ou não, o Ibra estava a um passo de fazer história.
Vendo a vaca ir para o brejo, Paulo Bento mexe no time e coloca William Carvalho no lugar de Raul Meireles para retomar o meio de campo. A mudança faz efeito imediato. Aos 76’, William intercepta a bola e começa mais um contra-ataque que até então era a melhor aposta portuguesa no confronto. A bola cai em Veloso que aciona Hugo Almeida na função de pivô e acha Cristiano Ronaldo. Com apenas um toque na coxa direita, ele domina e, com a perna esquerda, chuta cruzado para marcar o segundo de Portugal e reestabelecer o 2 a 2 no placar. Era um balde de água fria para o ímpeto sueco.
Na comemoração, Ronaldo inicia o gesto que marcaria os anos seguintes da sua carreira. Atrás do gol, grita e sinaliza: “Eu estou aqui”. Predestinado ou não, ele realmente colocava Portugal na Copa.
Dois minutos depois, Moutinho acha, mais uma vez, Ronaldo livre. Com três toques com a perna direita, CR7 dribla o goleiro Isaksson e vira a partida: 3 a 2 para Portugal, minando o sonho sueco e carimbando a classificação lusa para Copa do Mundo do Brasil de 2014. Na comemoração, Ronaldo parte para os braços da equipe parecendo não acreditar no que acabava de fazer. É, sem dúvidas, uma das maiores atuações da sua carreira.

Os três gols de Ronaldo arrancaram as palmas de Ibrahimovic e um olhar incrédulo do técnico Erik Hamrén como se dissesse: “Nós tentamos de tudo, mas contra ele não foi possível”. Cristiano ainda teve tempo e chances para fazer 4° e o 5° dele, mas seu chute passou rente a trave e desperdiçou dois contra-ataques. Do lado amarelo, Elmander também teve chance de recolocar a Suécia no jogo, porém desperdiçou.
Na época, com os três gols da classificação para a Copa de 2014, Ronaldo igualou a marca de Pauleta, com 47 gols, como maior artilheiro da Seleção Portuguesa. Em março de 2022, Cristiano tem 115 gols em 184 partidas, sendo não só o maior artilheiro de Portugal, mas também de todas as seleções
Com o apito final, as lentes só mostravam Cristiano Ronaldo e a felicidade dos portugueses presentes no estádio. Portugal estava garantido na Copa do Mundo de 2014 após um legítimo jogaço com 5 gols em 45 minutos e duas viradas no placar. A Suécia esteve perto por alguns minutos, mas teve a esperança ceifada por uma noite esplendorosa de Cristiano Ronaldo com 3 gols e João Moutinho com duas assistências.
No fim das contas, esta repescagem mostra o quão grande é Cristiano Ronaldo. No agregado, Portugal venceu por 4 a 2 a Suécia com 4 gols de CR7: um de cabeça, dois de perna esquerda e um de perna direita. Um atacante completo que decide na bola parada, no contra-ataque e na jogada ensaiada.
Suécia 2-3 Portugal
Suécia: Isaksson; Lustig, Nilsson, Antonsson e Martin Olsson; Larsson, Elm (Svensson), Källstrom e Kacaniklic (Durmaz); Ibrahimovic e Elmander. Técnico: Erik Hamrén
Portugal: Rui Patrício; João Pereira, Pepe, Bruno Alves e Fábio Coentrão; Miguel Veloso, Raúl Meireles (William) e João Moutinho; Nani, Hugo Almeida (Ricardo Costa) e Cristiano Ronaldo. Técnico: Paulo Bento.
Gols: Ibrahimovic (67’ e 71’); Cristiano Ronaldo (50’, 76’ e 78’)
Árbitro: Howard Webb (Inglaterra)
Local: Estádio Friends Arena, em Solna (Suécia)
Data: 19 de novembro de 2013, terça-feira