Não há motivos. Nesse momento, em março de 2021, realmente não há motivos.

Na quarta-feira (03), o Brasil registrou o pior número de mortes na pandemia. Em 24 horas, 1.840 histórias terminaram mais cedo. Na terça (02), foram 1.726 mortes. São pessoas, vidas e famílias abaladas. Todos esses números são de acordo com o consórcio de veículos de imprensa, afinal, não temos esses dados repassados sequer pelo Ministério da Saúde do país.

Infelizmente, dói escrever isso, mas não me parece que ficará por aí. Dias piores e mais sombrios parecem estar a caminho. O que é isso que estamos vivendo? Me pergunto todo dia pela manhã. Talvez o que mais me revolta e, acho que não só a mim, é o descaso. Achar que é normal e devemos seguir. Não é bem assim. Não deve ser assim.

JUNHO/20: Botafogo protesta contra a volta do futebol no Rio de Janeiro VITOR SILVA / AFP
JUNHO/20: Botafogo protesta contra a volta do futebol no Rio de Janeiro VITOR SILVA / AFP

O discurso de Lisca fez dar o clique e despertar para entendermos a loucura em que estamos vivendo. Para o meu amigo leitor que não está tanto por dentro do futebol, Lisca, ou melhor, Luiz Carlos, é o atual treinador do América-MG.

Antes da partida contra o Athletic pela segunda rodada do Campeonato Mineiro, Lisca fez um desabafo: “Não é hora mais (de futebol), é hora de segurar a vida”. Enquanto apelava para as autoridades, complementou ainda: “Não tem lugar nos hospitais”. Conhecido muita das vezes pelo sobrenome de Doido, Lisca de doido não tem nada. Ele nos alerta para algo que todos sabemos, mas que já acostumamos. Que trágico. É uma pena haver  tão poucos como Lisca.

Fato é que a CBF divulgou o calendário da Copa do Brasil. A competição, que talvez seja a mais charmosa do país, envolve clubes de todos os estados. Com partidas marcadas para as próximas duas semanas, teremos jogadores transitando por todo o país. Por exemplo, na próxima quarta (10), o Paysandu/PA vai até o Rio de Janeiro enfrentar o Madureira. Não vou nem entrar no mérito da partida ser realizada às 15h30 no verão da zona norte carioca.

Em uma conta rápida, são 80 clubes nessa fase da Copa do Brasil. Se levar em consideração 30 pessoas na delegação de cada time, teremos, em média, 2400 andando de um lado para o outro do país. Na Arena Amazônia, outro exemplo, o Penarol/AM enfrentará o Ypiranga/RS na próxima quinta (18). Parece um confronto normal, mas Manaus já registrou casos da nova cepa altamente contagiosa e que poucos sabemos como será. Do outro lado, no sul do país, leitos quase todos cheios, sem vagas. Que situação. Não há palavras para definir tamanha desorientação com a realidade.

E não estamos falando somente do Brasil. Alguns jogos da Champions e Europa League foram disputados em países neutros, de acordo com as restrições impostas por cada governo. Benfica (POR) e Arsenal (ING) jogaram tanto em Roma quanto em Atenas. É estranho, ainda mais com as arquibancadas vazias, porém se torna mais estranho ainda  poder entrar em outros países, mas no meu não, por favor.

Agora, se vocês se perguntam: o quanto o futebol tem sido afetado pelo COVID? Ainda não sei lhe responder, talvez ninguém saiba com exatidão. A FIFA, entidade máxima do futebol, prevê um prejuízo estimado de 4 bilhões de euros ao futebol mundial.

Ou seja, afeta psicologicamente, socialmente e financeiramente. Não tem como escapar. Como Franklin Foer citou, o futebol é capaz de explicar o mundo. E, nesses últimos meses, ele vem explicando da pior forma possível.